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Cadeia produtiva da carne ovina, uma experiência prática

Por Octávio Rossi de Morais
postado em 20/03/2007

14 comentários
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O assunto "organização da cadeia produtiva da carne ovina" é recorrente em qualquer encontro que trate da ovinocultura e em qualquer estado onde esse encontro ocorra. As pessoas falam de participação dos produtores, de negociações em câmaras, da falta de apoio oficial, etc. Mas pensemos um pouco... a cadeia produtiva da bovinocultura de corte é organizada?

O Brasil possui o maior rebanho bovino do mundo, é o maior exportador de carne bovina e o produtor ainda não sabe bem onde se insere na cadeia. Frigoríficos são construídos com dificuldade e "quebram" com grande facilidade, não sem antes consumirem grandes quantias em dinheiro privado ou público. Os preços ao consumidor são, aparentemente, desvinculados da realidade do restante da cadeia. Há uma constante queda-de-braço entre os elos produção, beneficiamento, comercialização e consumo.

Quem convive com pecuaristas está acostumado a vê-los telefonado, como loucos, para um sem número de frigoríficos, perguntando quanto é que estão pagando pelo boi. Se o próprio produtor não sabe o valor do seu produto, como é que ele quer reclamar de preços?

A organização de uma cadeia produtiva pode até ocorrer com o tempo, mas não é isso que temos observado no Brasil. Os componentes da cadeia, de um modo geral, desconhecem as dificuldades um do outro, sempre empurrando para os demais a culpa pelos descaminhos da atividade.

A experiência que temos vivido com a Cooperativa Mineira de Produtores de Cordeiro, a Procordeiro, tem nos ensinado muito sobre a cadeia produtiva. A Procordeiro reúne a produção de seus cooperados, transporta os cordeiros e ovelhas, paga pelo abate em frigorífico de terceiros, recebe de volta todos os produtos, faz e também terceiriza seu beneficiamento e os comercializa. Desta forma, a cooperativa se envolve em toda a cadeia e vivencia os problemas de cada elo.

Embora o frigorífico não pertença à cooperativa, nós nos envolvemos muito intensamente na sua liberação pelo Serviço de Inspeção Federal e também para a licença ambiental (o atual já é o terceiro frigorífico do qual acompanhamos o processo). É um trabalho hercúleo. Dentro dos próprios órgãos de defesa sanitária há uma imensa dificuldade na resolução de problemas: mesmo com boa vontade dos funcionários há desconhecimento, burocracia exagerada e legislação deficiente ou de difícil interpretação.

No comércio, aprendemos que produtos nobres muitas vezes têm que cobrir prejuízos dos produtos "não nobres". O custo de frigorificação e a perda de qualidade inviabilizam o estoque por longo tempo. Por outro lado, carne "não nobre" estocada diminui a capacidade de giro de produtos. Com tudo isso, faltam determinados produtos para venda e sobram outros tantos.

Uma saída é processar as carnes menos vendáveis, transformando-a em produtos de fácil comércio, mas isto também gera custos e novos caminhos a serem percorridos: contrato com uma indústria, capacidade de fornecimento para a mesma dentro das normas e prazos estabelecidos, abertura de novos mercados. Para isto, é preciso contar com o produto, e obviamente com o produtor.

A Procordeiro está lançando o quibe de cordeiro com a marca da indústria que processa a carne em parceria com ela, mas já se prevê dificuldades na regularidade caso não haja aumento na produção ou a entrada de novos cooperados. A carne que segue para processamento tem que custar muito mais barato que a carne nobre de venda in natura, isto quer dizer que não se pode aumentar ou regular o fornecimento para a indústria com este tipo de produto.

O que se pode concluir disso é que os custos de cada elo da corrente envolvem também os riscos que cada um é obrigado a correr. Como o produtor é o elo com menor capacidade de se proteger do risco, ele normalmente se sente vítima. Muitos encontram uma saída na informalidade, mas passam a ser "criadores de galinha", ou seja, têm uns carneirinhos para matar para os amigos e vizinhos e assim não contribuem para a perpetuação da atividade.

Organizados, os produtores tornam-se um elo forte, e, ao se envolverem na cadeia e participar dos processos decisórios, podem também entender e interferir na política de preços de seu próprio produto.

Não há vilões nem mocinhos: o produtor é descapitalizado e tem pouco apoio oficial, mas é individualista e imediatista. Os frigoríficos e a indústria impõem suas políticas com mão de ferro, mas passam por processos exaustivos na sua aprovação, têm altos custos de construção, manutenção e funcionamento, alta dependência de mão de obra qualificada e uma administração muito complicada.

O comércio, que é quem tem o contato direto com o consumidor sofre as pressões desse contato e fica à mercê dos fornecedores. Até o atravessador, essa figura tão mal falada, é um agente facilitador quando as peças da engrenagem não se encaixam direito. Ele apenas cobra o valor de seu trabalho e dos riscos aos quais se expõe.

Com nossa pequena experiência de quatro anos de cooperativa aprendemos que:

  • O melhor caminho para todos se inicia com a organização dos produtores. É preciso compreender que isolados não temos vida longa;

  • Analisar a experiência de terceiros é fundamental para "errar menos";

  • Não se deve tentar avançar sem uma base sólida (construir um mini-frigorífico, por exemplo, só com um plantel organizado de pelo menos 50 mil matrizes);

  • Todos os envolvidos numa cadeia produtiva passam por dificuldades, mas têm também facilidades que podem ser aproveitadas na solução das dificuldades dos outros elos e, assim, beneficiar a todos.


  • Organizar a cadeia produtiva exige envolvimento direto, conhecimento das questões específicas e vontade dos envolvidos em fazer a atividade evoluir como um todo. O equilíbrio de forças pode não ser a alternativa imediatamente mais rentável para alguns, mas é sem dúvida a que dá sustentabilidade à atividade.

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    Comentários

    Nei Antonio Kukla

    União da Vitória - Paraná - Consultoria/extensão rural
    postado em 22/03/2007

    O aprendizado com a cooperativa, resumido em 4 itens é a síntese do que deve ocorrer com a cadeia produtiva ovina. Falo da ovinocultura porque é o assunto vertente, mas nem a cadeia do leite, nem da bovinocultura de corte e nem da suinocultura encontram-se organizadas.

    Apesar do grande esforço da extensão rural, encontra-se muito individualismo e imediatismo entre os produtores, dificultando o processo de organização. Trata-se de um sistema de médio e longo prazos, onde nem técnico e nem criador podem querer resultados para amanhã, pois isso desestimula os envolvidos e o barco acaba afundando.

    A união das forças, o conhecimento do caminho que se quer chegar são premissas para organizar uma cadeia produtiva, seja ela ovina, leite, carne.

    Nei Antonio Kukla
    Porto União - SC

    Paulo de Tarso dos Santos Martins

    Várzea Grande - Mato Grosso - Consultoria/extensão rural
    postado em 22/03/2007

    Parabens Otávio pela iniciativa e coragem.

    Zoot. Paulo de Tarso

    Marcos de Toledo Piza

    Uberlândia - Minas Gerais - comercio internacional
    postado em 22/03/2007

    Parabéns ao artigo do Sr. Otavio Morais e ao trabalho que vem sendo executado pelo Sr. Ronaldo Vianna Lage da Procordeiro.

    Hoje sou vice presidente da ACOTA (Associação dos Criadores de Caprinos e Ovinos do Triângulo Mineiro e Alto Paranaiba) e observamos e lutamos exatamente com a dificuldade da falta de união da classe produtora e falta de um frigorífico local regularizado pelo SIF para abate de ovinos.

    Vimos realizando um árduo trabalho em conscientizar os produtores, num esforço incessante onde poucos trabalham e os demais simplesmente por pagarem a associação ficam no aguardo do desfrute dos esforços de poucos.

    Acredito que o problema que sofremos é o mesmo de muitas outras classes e entidades, assim como do Brasil em geral; é tudo fruto de uma baixa educação e a famosa lei de gersom onde se acredita que tudo é obrigação do governo ou das entidades pois eu já paguei meu imposto ou mensalidade.

    Temos é que mudar a mentalidade do nosso povo e dar educação e formação profissional a nossos filhos para quem sabe daqui a 50 anos podermos iniciar a colheita dos frutos plantados.

    Gostaria muito de acreditar que nossos companheiros vão arrecadar as mangas e ajudar aos 4 ou 5 quem vem trabahando pró comunidade, participando para um futuro promissor.

    Sem mais
    Marcos Piza

    Octávio Rossi de Morais

    Sobral - Ceará - Pesquisa/ensino
    postado em 26/03/2007

    Obrigado aos senhores pelos comentários. Na cooperativa vivenciamos também o individualismo daqueles que não sabem bem porque se associaram. É muito comum algum cooperado ligar para a cooperativa e perguntar: "Quanto é que vocês estão pagando?" Eles não sabem que são donos do negócio, não participam e nem fazem força para a própria empresa crescer.

    Glaucio Pereira de Assis

    Ouro Branco Ouro Fino - Minas Gerais - Produção de ovinos
    postado em 27/03/2007

    Otávio,

    Parabéns pelas suas colocações sobre as dificuldades do produtor isolado em entrar no comércio da carne ovina. Sabemos por experiência própria que o grande gargalo da ovinocultura de corte principalmente no sudeste, é a venda do cordeiro.

    Primeiro, pela pouca experiência dos produtores da região na atividade ovina e segundo: falta-nos o principal que é a nossa organização como produtores de carne ovina.

    Temos participado de palestras e ministrado cursos de ovinocultura, sempre levando ao produtor de carne ovina a necessidade que temos de produzir bem e também vender bem. Não queremos dizer com isso que somos obrigados a fazer todo ciclo da cadeia ovina: criar, recriar, terminar, abater e distribuir a carne.

    Cada um de nós temos uma função nesta cadeia e precisamos avaliar em qual delas nos inserimos. E para isso acreditamos que a organização dos produtores é fundamental para o sucesso de todos.

    Abraço.

    Glaucio Pereira de Assis
    Diretor Técnico da ACROSUL (Associação dos Criadores de Ovinos do Sul de Minas)

    Álvaro Ferreira Júnior

    Uberlândia - Minas Gerais - Pesquisa/ensino
    postado em 29/03/2007

    Como breve comentário gostaria de dizer que em nossa universidade fundei um grupo de estudos sobre ovinos com outros colegas professores da área de nutrição, melhoramento, doenças parasitária e com a participação de nossos alunos.

    Nossos objetivos são, dentro de nossas possibilidades e parcerias, gerar novos conhecimentos nessas áreas, realizar a extensão rural e poder contribuir com idéias e projetos para a formação dessa cadeia produtiva em nossa cidade e região.

    Uma de minhas grandes preocupações com ovinos é o fato de não haver ainda um mercado consumidor forte em Uberlândia (ainda que isso seja praticamente nacional) que absorva e remunere de forma compatível produtos terminados de qualidade e que por isso consumiram muito tempo, técnica e dinheiro.

    Queria muito poder ver em minha cidade uma feira gastronômica mensal de ovinos que melhorasse a cultura de consumo da carne de cordeiro tornando-a mais frequente e um local de venda especializado em ovinos. Pode ser que dê certo!

    Não sou criador de ovinos, mas me interessa muito ver esta atividade crescer em nossa Uberlândia, parabéns ao presidente o Sr. Marcos de Toledo Piza. Parabéns ao Dr. Octávio R. Morais pelas pesquisas e os trabalhos realizados.

    Obrigado.

    Octávio Rossi de Morais

    Sobral - Ceará - Pesquisa/ensino
    postado em 29/03/2007

    Sem dúvida Gláucio. O produtor precisa entender que outro produtor não é seu concorrente e sim, parceiro. Para vender bem é preciso ter força dentro da cadeia e isso só acontece quando há união.

    Octávio Rossi de Morais

    Sobral - Ceará - Pesquisa/ensino
    postado em 30/03/2007

    Álvaro parabens pela sua iniciativa e obrigado pela carta. Na UFMG também fundamos um grupo de estudos quando estava no doutorado e hoje ele caminha com outros alunos da graduação e da pós. Muitos dos frequentadores do grupo trabalham hoje exclusivamente com ovinos.

    Quanto ao mercado, não se preocupe, nas capitais a demanda vai aumentando, graças a Deus na proporção que podemos ir atendendo. Logo em seguida será a vez das grandes cidades do interior, não tenha dúvida. É preciso tomar cuidado ao fazer a propaganda de um produto, pois você terá que tê-lo disponível sempre. Muitos mercados foram perdidos por falta de constância na oferta.

    Jesus Xavier Ferro

    Goiânia - Goiás - Instituições governamentais
    postado em 07/04/2007

    Matéria muito boa sobre este assunto, Jesus

    Walter Rogério Diesel

    Goiânia - Goiás - Pesquisa/ensino
    postado em 09/04/2007

    Caros colegas e Dr. Octávio,

    Mais uma vez concordamos, tendo em vista as opiniões manifestadas sobre o tema, que a solução do nosso problema está em nossas próprias mãos, e parte nas políticas públicas. Parabenizo-o também Dr. Octávio, pois tens clareza e seriedade ao tratar da cadeia de ovinos.

    Mas quero aproveitar para instigar um pouco mais outros leitores e nossos próprios representantes governamentais, e nossas próprias associações de criadores.

    Os problemas que passamos são, na verdade, inerentes ao fato de a ovinocultura estar crescendo a passos largos no Brasil, sem que tenhamos a mesma agilidade em promover a organização e direcionair os investimentos por meio de políticas públicas voltadas para fomentar a competitividade da cadeia produtiva da carne ovina, nosso grande objetivo.

    De um lado, precisamos que o produtor melhore a sua condição técnica de produzir de modo sustentável economicamente, e de outro precisamos de apoio dos representantes para pesquisar as melhores alternativas necessárias para resolver os problemas que V.Sa. muito claramente nos colocou.

    Penso que precisamos de um programa nacional visando promover o desenvolvimento e a competitividade da cadeia da carne ovina, além de muita consciência como produtores, de que não podemos ser competitivos se não fizermos bem nosso dever como produtores. Ao mesmo tempo, também não seremos competitivos se agirmos isoladamente e se não explorarmos o potencial do nosso mercado interno. Algumas lições são óbvias para podermos crescer:

    - buscar qualidade compatível com nossos principais concorrentes;

    - ter condições de avaliar a escala mínima que nos permita alcançar rentabilidade aos preços praticados nos principais mercados concorrentes;

    - termos objetivos definidos, e para isso precisamos de direcionamento por meio de políticas específicas e compatíveis com a nossa realidade;

    - conhecer nosso mercado comprador interno e externo a fim de sabermos o que produzir, aonde vender e a que preço.

    Agradeço a oportunidade de acrescentar essas meras palavras, e vamos ser confiantes em nosso potencial.

    Abraço a todos,

    Prof. Walter Rogério Diesel
    Economista/UNIVERSO-GO
    Presidente da Capriovino - Associação Goiana dos Criadores de Caprinos e Ovinos

    waldemar gertner

    Tucano - Bahia - Produção de caprinos de leite
    postado em 10/04/2007

    Parabéns por abordar o grande gargalo que se depara à ovinocaprinocultura, não é facil resolver os problemas de produção mas já temos aqui no Oeste da Bahia alguns produtores com mais de mil matrizes cada e começando a dominar o manejo e obtendo bons índices produtivos e reprodutivos com a facilidade que temos de obtenção de insumos a preços que remuneram o produtor.

    Mas a dificuldade de reunir os produtores, fazer o frigorífico entender que tem que ser parceiro, e os atacadistas (distribuidores) terem a parcela de lucro compatível com a sua participação na cadeia produtiva é tarefa que nem a bovinocultura ainda resolveu como muito bem foi colocado no artigo.

    A atividade é viavel, vamos louvar o companheiro que abordou com tanta propiedade o assunto e trocarmos informações sobre toda a cadeia para melhorar a atividade.

    Octávio Rossi de Morais

    Sobral - Ceará - Pesquisa/ensino
    postado em 11/04/2007

    Obrigado ao Prof.Walter Diesel e ao Waldemar Gertner pelas cartas. Só posso concordar com o que vocês escreveram e comentar que as experiências têm sido muito parecidas.

    Alguns estão mais adiantados, outros apenas começando, mas a rede de dificuldades não é desemaranhada, parece que todos têm que passar pelas mesmas agruras.

    Acredito que temos que sensibilizar as autoridades a resolverem, ou minimizarem os problemas que dependem deles e que já conhecemos, para que os novos possam gastar sua energia somente com problemas ainda não detectados.

    Um abraço. Octávio

    Adailson Freire

    Olinda - Pernambuco - Produção de caprinos de corte
    postado em 12/04/2007

    Prezado Dr.Octávio R. Morais,

    Comparei o seu trabalho, com o que ocorre na Cadeia Produtiva da Apicultura que eu lido diariamente.
    As premissas:
    "Os preços ao consumidor são, aparentemente, desvinculados da realidade do restante da cadeia".
    "Há uma constante queda-de-braço entre os elos produção, beneficiamento, comercialização e consumo".
    São verdadeiras hoje no agronegócio.

    Atenciosamente,

    Adailson Freire

    Octávio Rossi de Morais

    Sobral - Ceará - Pesquisa/ensino
    postado em 17/04/2007

    Realmente Adailson, as realidades das cadeias envolvendo produção animal não diferem muito no que tange às relações de força entre os envolvidos. Acredito que isso seja fruto do individualismo do produtor e do descompromisso de todos (produção, beneficiamento e comércio) com cada atividade. É curioso que o mesmo ocorra na cadeia do mel, por ela ser muito específica.
    Um abraço. Octávio

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