Pododermatite infecciosa, também conhecida como "foot rot", podridão dos cascos ou pietan, é uma doença causada por bactérias que afetam os cascos dos ruminantes. Os sintomas iniciam-se com claudicação (manqueira), e/ou inflamação da epiderme interdigital. Um exame detalhado revela os primeiros sinais da doença: edema e umidade da pele da fenda interdigital. Na evolução da doença, ocorre um processo inflamatório mais nítido, e inicia-se uma separação da junção pele e casco. Há também destruição da matriz epidérmica sob a parte dura do casco, que estabelece as condições para o aparecimento da necrose tecidual profunda, que descola totalmente o casco.
A doença pode afetar mais de uma pata e, nos casos mais avançados, os animais, quando caminham, utilizam três patas ou pastam de joelhos. Essa dificuldade de locomoção para se alimentar traz uma série de consequências para o animal, e a primeira delas é o emagrecimento, que pode torná-lo suscetível a outras doenças, como a verminose, e levá-lo ao óbito.
A reprodução do rebanho também é muito afetada (principalmente quando o reprodutor é acometido nas patas traseiras), já que há comprometimento da monta para fertilizar a fêmea, e/ou dificuldade para acompanhá-las no pasto. A fêmea, por sua vez, tem dificuldade de suportar o peso do macho, e pode ter problemas reprodutivos devido à pior condição corporal, que pode se encontrar quando é portadora da doença. Cordeiros podem ter dificuldade de mamar em mães portadoras da doença, pois há dificuldade de elas permanecerem de pé, o que dificulta o aleitamento, e torna os cordeiros mais fracos, facilitando a incidência de outras doenças, como a verminose, levando-os também a óbito.
A desvalorização de animais de alto valor zootécnico é evidente, já que não podem ser conduzidos a exposições ou outros recintos, como leilões, assim como há desvalorização nos rebanhos portadores da doença, pois existe dificuldade na comercialização de animais para reprodução.
Além disso, há descarte, muitas vezes precoce, de reprodutores de alto valor zootécnico. Quando a doença se instala no rebanho, são altos os custos com tratamento e prevenção da doença, que envolvem gastos com medicamentos, produtos para o pedilúvio, vacina e mão-de-obra. O "foot rot" é considerado uma das doenças mais dispendiosas dos ovinos.
Na patogenia da doença estão envolvidas duas bactérias: Dichelobacter nodosus, gram-negativa, anaeróbica (não sobrevive na presença de oxigênio), e vive exclusivamente no tecido do casco dos ruminantes; e Fusobacterium necrophorum, habitante normal do trato digestivo de ruminantes. Esta última é a principal causadora da dermatite interdigital ou frieira, que cria um meio de anaerobiose nas lesões, favorecendo o estabelecimento de D. nodosus. Uma vez instalada, D. nodosus aprofunda a lesão provocada por F. necrophorum, o que causa destruição do tecido do casco (parte negra afetada no casco).
D. nodosus só é encontrada na natureza nos cascos de ruminantes com "foot rot". Possui crescimento e reprodução lentos, e pode permanecer por longos períodos na lesão, mesmo com escassez de nutrientes, o que torna o processo crônico. Ela também produz uma substância que estimula o crescimento e, consequentemente, o poder destrutivo de F. necrophorum. Essas bactérias podem conservar seus poderes infectantes no tecido necrótico do casco durante três meses, e permanecer viáveis nele por até três anos (ÁVILA; COUTINHO, 2006).
D. nodosus apresenta grande variedade de sorotipos, classificados conforme seu antígeno pili (filamentos apresentados pela bactéria à microscopia eletrônica que determinam sua virulência e servem para caracterizar os diversos sorotipos). Existem amostras patogênicas que levam a casos virulentos de "foot rot", e amostras não virulentas que causam lesões benignas (menos contagiosas) da doença. As amostras virulentas são grandes produtoras de protease (medida em agar gel), e possuem pili.
Lama e esterco facilitam o aparecimento da doença, pelo amolecimento do casco devido à umidade e à proliferação das bactérias pelo meio se tornar anaeróbico no casco.
Geralmente, a doença entra na propriedade por meio da aquisição de um animal contaminado, com lesões crônicas ou até mesmo inaparentes. Os animais também podem adquirir a bactéria em caminhões de transporte não desinfetados, ou em uma estrada de terra, ou corredores, recentemente utilizados por animais contaminados, quando conduzidos a pé.
As bactérias ficam no solo, nas pastagens, ou na cama, onde estiver o animal contaminado, e, embora se estime que D. nodosus não sobreviva no ambiente por mais de 5 dias, quando algum animal do rebanho está infectado, contamina o local onde se encontra. Daí, em pouco tempo, todo o rebanho pode também se infectar, e apresentar sintomas de claudicação e inflamação do tecido interdigital.
Como no verão, por causa do aumento das chuvas, e consequente lama nos pastos, a doença é mais frequente, existe grande preocupação com a mosca da bicheira, que é atraída pelo mau cheiro característico da doença em seu início, principalmente no espaço interdigital, onde põe seus ovos, agravando sobremaneira o quadro geral do "foot rot" no rebanho.
Figura 1 - Animais que apresentam sinais da doença
Os artigos Parte II e Parte III abordarão prevenção e controle de "foot rot", respectivamente.
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