Não só no Brasil, mas no resto do mundo, a ovinocultura terminou 2007 com muitos indicativos positivos nos principais países produtores de ovinos: Reino Unido aumentou a venda de carne de cordeiro em 8,6%, Espanha investirá em 2008 cerca de US$ 513 milhões no setor de ovinos e caprinos, Uruguai aumentou as exportações de carne ovina em 21,6%, Austrália produziu 15% mais carne de cordeiro no final de 2007 e a Nova Zelândia registrou recordes de exportações no ano passado (Farmpoint, 2008), ou seja, a demanda mundial por carne de cordeiro continua em alta.
Em um cenário tão promissor, muitos se encantam e pensam em participar deste mercado internacional que movimenta milhões de dólares. Entretanto, o mercado interno brasileiro tem apresentado aumento de demanda, mas a oferta de carne de cordeiro de qualidade ainda é muito pequena, sendo necessário importar, principalmente dos vizinhos do Mercosul Argentina, Uruguai e Chile, contribuindo com os resultados positivos na ovinocultura destes países.
Mas porque que o Brasil, mesmo após anos consecutivos de bons resultados no setor ainda não reverteu este cenário interno?
Para esta pergunta, geralmente obtemos diversas respostas como os problemas na estruturação da cadeia produtiva ou sobre a falta de programas de financiamento governamentais, mas existe uma questão bem simples e de muita importância: o valor do seu manejo.
Quanto custa para um produtor usar a ração mais barata em comparação a ração de custo mínimo e ganho máximo, geralmente mais cara? Qual o custo de não suplementar uma matriz em final de gestação e início de lactação, e ter uma matriz magra depois da desmama? Qual o valor para engordar cordeiros em pastagem e em confinamento e ter menor ganho de peso diário, maior idade ao abate e possivelmente, problemas com verminose durante este período? Quais as conseqüências da ausência de água e área sombreada em todos os piquetes de pastejo e os animais terem que caminhas grandes distâncias só para beber água ou abrigar-se do sol em horários de pico? Qual o gasto energético deste "esforço" extra? Quanto de leite ou de cordeiro ela deixa de produzir para simplesmente sobreviver? Estação de monta aumenta ou diminui o custo do manejo reprodutivo?
Infelizmente a maioria dos nossos produtores desconhece tais perguntas ou a importância dessas respostas.
A ovinocultura, assim como outras atividades, está em constante desenvolvimento e evolução, mas se os produtores iniciassem com o básico, usando tecnologia já desenvolvida há muito tempo, mas fundamentais até hoje, o cenário interno brasileiro da ovinocultura poderia ser diferente.
Monteiro (2007) pesquisou custos de produção de cordeiro e Emediato (2007) em simulação de produção de leite ovino, encontraram a mão-de-obra como o item de maior contribuição para o custo final de produção, com 31 e 47%, respectivamente, ambos seguidos pela alimentação (24 e 22%, respectivamente). Ou seja, a mão-de-obra empregada precisa ser a mais eficiente possível, independente de ser familiar ou contratada. A mão-de-obra familiar muitas vezes é desconsiderada, mas é como a mão-de-obra de um artesão, tem que ser incluída no custo de produção e no preço de venda.
Boucinhas & Siqueira (2004) suplementaram 136 ovelhas Santa Inês em sistema rotacionado de pastagem com 500g/dia de ração concentrada durante 3 semanas antes e 4 após início da estação de monta e 3 semanas antes do parto e durante a lactação, durante 3 estações de monta consecutivas visando obtenção de 3 partos em 2 anos. A suplementação permitiu às ovelhas entrar em estação de monta, parir e amamentar sempre com maior peso do que as não suplementadas, o que resultou em maior taxa de fertilidade e de partos duplos para as ovelhas suplementadas, que tiveram menor taxa de mortalidade de cordeiros.
Tabela 1: Comparativo resumido entre os dois tratamentos
Santos & Siqueira (2006) suplementaram 434 ovelhas mestiças Ile de France com 300 g/dia de ração concentrada durantes as 3 semanas antes do parto e durante a lactação e desmamaram os cordeiros com 60, 75, 90 e 105 dias de idade. Novamente a suplementação proporcionou maior taxa de prenhez, maiores pesos ao nascer e ajustado à desmama, este principalmente devido à maior produção de leite, e mesmo tendo gerado maior custo de produção/cordeiro, resultou em maior receita, pois as ovelhas suplementadas produziram 9,8% mais cordeiros do que as não suplementadas.
Tabela 2: Comparativo resumido entre os dois tratamentos
Maestá & Siqueira (2006) recriaram 26 cordeiras da raça Bergamácia da desmama (60 dias) até o primeiro parto, confinadas e em pastagem. O confinamento destas cordeiras resultou em menor idade à puberdade, alcançada 166 dias antes das outras, com a contagem de OPG (ovos por grama de fezes) sempre zero, diferente das ovelhas da pastagem que precisaram receber algumas doses de vermífugos ao longo do experimento.
Tabela 3: Comparativo resumido entre os dois tratamentos
Emediato & Siqueira, em um rebanho de 77 ovelhas da raça Bergamácia, suplementaram 40 delas com 35 g/cab/dia de gordura protegida da fermentação ruminal (sal cálcico de ácidos graxos de cadeia longa - Megalac-E® - Church and Dwight Co. Inc.) durante 60 dias de lactação (com prévia adaptação de 20 dias) em um sistema misto de produção de leite. As duas dietas apresentavam os mesmos níveis de proteína e gordura e as ovelhas recebiam por dia 1 kg de concentrado e 1 kg MS de silagem de milho por dia, duas vezes ao dia.
Este suplemento energético é muito utilizado para vacas leiteira de boa produção e possui um alto valor no mercado. No ano do experimento, custava R$ 2,60/kg e como pode-se observar na Tabela 4, os resultados foram favoráveis.
Os animais suplementados receberam um concentrado R$ 0,04 mais caro, o que resultou em um gasto R$ 2,40 maior/ovelha, em alimentação, durante o período experimental (60 dias), entretanto, o mesmo grupo produziu 12,7% a mais de leite por ovelhas. Essa diferença resultou em R$ 2,70 a mais de retorno/ovelha no período avaliado. Caso o leite fosse usado para a fabricação de queijos, visto que o queijo ovino tem alto valor agregado e considerando rendimento médio de queijos ovinos de 20% (Jordan & Boylan, 1995) ou 5,0 litros de leite/kg de queijo, o grupo suplementado produziria 23,51 kg de queijo a mais e caso fossem vendidos a R$ 50,00/kg, resultaria em um retorno R$ 1.175,50 maior. Na simulação com produção de queijo, cada ovelha que consumiu o concentrado com gordura protegida, retornaria R$ 9,00 a mais.
Tabela 4: Simulação de fluxo de caixa considerando o custo dos concentrados e a receita obtida com a venda do leite ou de queijo, entre os tratamentos, durante os 60 dias.
1 Consumo de 1 kg de concentrado/ovelhas/dia, durante 60 dias;
2 Preço de mercado do litro de leite ovino = R$ 3,00;
3 Rendimento médio de 20% do queijo Blue Cheese, de leite ovino (Jordan & Boylan, 1995);
4 Preço sugerido de R$ 50,00/kg de queijo.
C - Controle; GP - Gordura Protegida.
Outros experimentos, utilizando-se de outras tecnologias de manejo têm apresentado resultados similares, geralmente com maior custo de produção, mas, no entanto, maior retorno econômico, que deve ser o objetivo principal de uma propriedade comercial.
Entretanto, vale salientar que qualquer tecnologia a ser utilizada deve ser antes avaliada junto à realidade econômica que se vive. Avaliar os preços pagos pelo mercado e conhecer o seu custo de produção é de suma importância antes de investir. Os ganhos indiretos, que não representam entrada direta de capital em caixa devem ser analisados, pois os ganhos em alcançar menores idade ao abate, intervalo entre partos, idade à puberdade e mortalidade de ovelhas e cordeiros, e maiores produção de kg de cordeiros/ovelha, peso de ovelha à desmama, entre outros, também possuem um valor econômico implícito e muito importante para o sucesso da atividade. A simples conta matemática "do que entrou menos o que saiu" já está a muito tempo ultrapassada, e já foi responsável pela falência de muito pecuaristas, principalmente da atividade leiteira.
Tudo que acontece dentro da propriedade tem um preço real e este deve sempre ser considerado quando temos que tomar uma decisão, principalmente nos momentos mais críticos da economia.
Bibliografia consultada
Monteiro, A.L.G., Barros, C.S., Canziani, V. Análise econômica de sistemas de produção de ovinos para carne, www.farmpoint.com.br, 2007.
Emediato, R.M.S. Produção de leite ovino, um mercado para ser explorado. Ciclo de palestras Feileite, 2007.
Emediato, R.M.S., Siqueira, E.R. Efeito da gordura protegida sobre parâmetros produtivos de ovelhas da raça Bergamácia e na elaboração de queijos. Dissertação de mestrado, FMVZ, UNESP, 2007.
Farmpoint, reportagens publicadas em Janeiro de 2008.
Boucinhas, C.C., Siqueira, E.R. Análise técnica e econômica de dois sistemas de alimentação de ovelhas manejadas para três partos a cada dois anos. Dissertação de mestrado, FMVZ, UNESP, 2004.
Santos, B.F.S., Siqueira, E.R. Resultados econômicos e desempenho de ovelhas e cordeiros sob distintos manejos alimentares e idades a desmama, em sistema intensivo de produção de carne. Dissertação de mestrado, FMVZ, UNESP, 2006.
Maestá, S.A., Siqueira, E.R. Idade à puberdade de cordeiras Bergamácia submetidas a dois sistemas de desmama criadas em pasto e confinamento. Parte da pesquisa de pós doutorado, 2006. (artigo não publicado)