Fechar
Receba nossa newsletter

É só se cadastrar! Você recebe em primeira mão os links para todo o conteúdo publicado, além de outras novidades, diretamente em seu e-mail. E é de graça.

Agricultura e crise mundial

Por ANDRE MELONI NASSAR
postado em 05/11/2008

3 comentários
Aumentar tamanho do texto Diminuir tamanho do texto Imprimir conteúdo da página

 

A motivação deste artigo é colocar mais alguns elementos nas discussões sobre os impactos da crise financeira mundial no desempenho do setor agrícola brasileiro. As preocupações estão centradas em dois pontos: a capacidade financeira dos produtores para custear o plantio da safra 2008-2009 (plantada no segundo semestre de 2008 e colhida no primeiro semestre de 2009) diante de um cenário de menor oferta de crédito; e, uma vez colhida a safra, o resultado financeiro da produção diante de custos mais elevados e, pelo menos até hoje, preços em queda no mercado internacional.

A percepção que existe no setor agrícola, muito bem discutida em entrevista do ex-ministro Roberto Rodrigues ao Estadão (12/10), é de que os produtores estão diante de um ambiente de muita incerteza, sobretudo quanto aos preços no momento de venda da safra. Essa incerteza, que poderá culminar em queda de renda, precisaria ser mitigada por medidas de política agrícola, sob pena de o setor produtivo entrar em crise novamente.

Embora compartilhe esse argumento, basicamente por achar que esse é um cenário possível, entre a escassez de crédito e as incertezas quanto aos preços no ano que vem, fico com o primeiro como o mais preocupante. Sou mais otimista em relação ao segundo. Do ponto de vista de mercado, as perspectivas de preços para a comercialização da safra de grãos 2008-2009 são, sem dúvida, menos interessantes do que aquelas a que temos assistido este ano. Mesmo diante de custos de produção mais elevados, no entanto, ainda podemos esperar resultados positivos na produção de soja, milho e arroz. A grande exceção é o algodão.

Para dar suporte a esse argumento levantei os custos e preços da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) para soja, milho, algodão e arroz. No caso de soja e milho, trabalhei com as praças de Paraná, Goiás e Mato Grosso. Para algodão coletei os dados de Bahia, Goiás e Mato Grosso. A análise do arroz ficou centrada no Rio Grande do Sul.

Dado que ainda desconhecemos os preços para o ano de 2009, quando a safra brasileira será comercializada, assumi uma taxa de câmbio de R$ 2 para cada dólar e considerei os preços mundiais do mês de outubro (Bolsa de Chicago para soja e milho, Bolsa de Nova York para algodão e preços de exportação da Tailândia para arroz) como referência para os preços médios a serem recebidos pelos produtores no próximo ano. Estou falando de preços ao redor de US$ 380, US$ 190, US$ 1.200 e US$ 650 por tonelada para soja, milho, algodão e arroz. Preços nesses patamares para 2009 significam que os produtos terão valores médios, em dólar, 20%, 17%, 19% e 20% menores do que este ano. Faz sentido imaginar que os preços de outubro refletem um patamar aceitável para o ano que vem porque eles são resultado de cinco meses de queda. Desde julho os preços mundiais vêm sentindo os efeitos da crise mundial. De junho a outubro os preços de soja, milho, algodão e arroz já caíram, em dólar, 30%, 31%, 22% e 22%, respectivamente.

Preços em queda são um sinal perigoso, sobretudo porque os custos aumentaram. Os dados da Conab mostram que os custos estão em alta em todos os produtos e praças produtoras. Nos Estados do Paraná, Goiás e Mato Grosso, a Conab calcula que os custos da soja estão 25%, 14% e 34% mais altos do que na safra passada. O mesmo ocorre com os custos de milho: 22%, 9% e 3% mais altos. No algodão, para as praças de Bahia e Goiás, os custos estão 31% e 5% mais altos. Em Mato Grosso, a Conab calcula custos constantes para o algodão. Os custos do arroz no Rio Grande Sul subiram 10% este ano. O crescimento dos custos terá maior ou menor importância dependendo dos preços de venda para o ano que vem.

Se os preços estão caindo no mercado internacional, devemos esperar que o mesmo ocorra aqui, no Brasil. A queda tenderá a ser menos acentuada se a taxa de câmbio ajudar. Assim, assumindo uma relação real x dólar em 2 x 1, observamos que a queda dos preços em reais também ocorre, mas de forma mais amena. Regra geral, os preços em reais ficariam no ano que vem entre 4% e 7% mais baixos do que este ano.

Custos em alta, preços em dólar e em real em queda. Teremos, portanto, uma crise agrícola? Depende da relação entre preços para os produtores e custos de produção. Assumindo que os preços nas praças produtoras vão acompanhar os preços mundiais, e comparando-os com os custos locais, podemos inferir o desempenho esperado de cada produto no ano que vem. Soja, no Paraná, em Goiás e Mato Grosso, e arroz, no Rio Grande do Sul, são produtos que deverão apresentar resultados positivos, embora menores do que os observados em 2008. Ambos os produtos não precisarão de suporte dos instrumentos de comercialização da política agrícola brasileira.

No caso do milho, Paraná e Goiás são praças que também não deverão ser objeto de preocupação no ano que vem. No caso de Mato Grosso, os resultados deverão ser pequenos. É provável que o governo brasileiro tenha de usar instrumentos de política para garantir renda no Estado. O cenário mais preocupante é o do algodão. Em todas as praças, Bahia, Goiás e Mato Grosso, os resultados deverão ser muito ruins porque os custos cresceram consideravelmente.

Embora as perspectivas para o algodão não sejam das melhores, não podemos afirmar, pela análise de preços e custos para a safra 2008-2009, que o setor agrícola brasileiro esteja diante de uma crise. Sem dúvida, o algodão é um produto que precisará de forte atenção do governo. No entanto, margens mais apertadas, que é o caso de soja, milho e arroz, não significam que a produção reviverá os anos ruins de 2005 a 2007. Do ponto de vista da política agrícola brasileira, portanto, a maior fonte de preocupação deve ser a disponibilidade de crédito, e não o desempenho esperado dos mercados no ano que vem.

Saiba mais sobre o autor desse conteúdo

ANDRE MELONI NASSAR    São Paulo - São Paulo

Pesquisa/ensino

Avalie esse conteúdo: (2 estrelas)

Comentários

jose luiz bicca heineck

São Gabriel - Rio Grande do Sul - Produção de gado de corte
postado em 05/11/2008

Dentre os habitantes de nosso planeta, alguns se alimentam e outros não. Falamos de alimentação básica. Mais diretamente acho que podemos estimar para 2009, no que se refere a arroz, soja e carne, preços parecidos com os preços médios praticados no último outono. Soja entre 40 e 45;arroz 35 e 40; carne 85 a 90 por arroba.

Uma pequena diminuição no consumo mundial deverá haver, nada que ultrapasse 5%. O que precisa haver é o prestigiamento do produtor organizado, consciente, que faz sempre uma boa analise de seu trabalho e escolhe as oportunidades. Uma parcela significativa de nossos produtores estão na linha de frente, isto se levarmos em conta quem está mais capitalizado, quem obtém as melhores médias, quem tem menor endividamento.

Na verdade os produtores deveriam ter a participação direta em suas atividades das multinacionais que aqui estão a vender produtos/insumos para a atividade rural.Algumas empresas gigantes vendem o insumo e ficam esperando pelo produto, sem assumir nehum risco nessa "parceria".

O produtor já tem como exigir um pouco mais de respeito. Um saco de adubo não pode passar de vinte reais para R$100,00. Este aumento precisa ser socializado entre produtor e fornecedor. Se foi provocado por lobystas de plantão e ou investidores especuladores, então mais uma razão para o produtor ter como parceira uma empresa de porte, de renome, que possa ajudá-lo a se defender dessa especulação.

Se o produtor não for defendido pelas multis que ficam esperando pelo produto do campo, qualquer dia desses não haverá mais produto. Só isso.

Fernando Castejon

Goiânia - Goiás - Engenheiro Agrônomo
postado em 07/11/2008

Muito bom a colocação em discussão dos impactos. Custos em alta e falta de dinheiro para finaciamento da safra é uma combinação muito perversa ao setor.
Na industria, como temos tendência baixista de preços, de imediato estão reduzindo estoques, o que só alimenta a baixa, e ainda não circula bens e serviços! 2009 é preocupante, mas como otimista de carterinha, vejo que a outra face da crise é oportunidade, e como disse o prof. Marins, CRISE = tire o S = > CRIE, e ai nós brasileiros somos mestres no jeitinho! O mercado Brasileiro é muito grande!

Gilson Aparecido de Paiva

Roncador - Paraná - Produção de gado de corte
postado em 17/12/2008

Esse debate é bem oportuno. Independente da área de atuação da pessoa, existe uma expectativa enorme acerca do dilema "como será daqui para frente"? O carro chefe da Economia brasileira é a Agricultura e Pecuária, portanto, é o foco principal e merece atenção dos governantes e será dada com certeza. O carro não anda sem combustível.

Concordo com o colega a respeito do valor da arroba do próximo ano. Todas as bolhas já foram estouradas com a crise internacional, e o preço será estabilizado em torno de R$ 80,00. Se não fosse o aumento do custo de produção dos bovinos (sal mineral/mão obra, medicamentos, bezerros) acredito que este valor estaria dentro da realidade de mercado.

A recomendação que repasso aos colegas é a seguinte, ouvi dias desses na TV um veterano produtor dizer: "Em tempo de crise temos que fazer três coisas: Trabalho, pé no chão e o passo conforme a perna"; feito isso atravessaremos todas as crises. Creiam nisso e com alta dose de otimismo, assim-venceremos.

Quer receber os próximos comentários desse artigo em seu e-mail?

Receber os próximos comentários em meu e-mail

Envie seu comentário:

3000 caracteres restantes


Enviar comentário
Todos os comentários são moderados pela equipe FarmPoint, e as opiniões aqui expressas são de responsabilidade exclusiva dos leitores. Contamos com sua colaboração. Obrigado.

Copyright © 2000 - 2024 AgriPoint - Serviços de Informação para o Agronegócio. - Todos os direitos reservados

O conteúdo deste site não pode ser copiado, reproduzido ou transmitido sem o consentimento expresso da AgriPoint.

Consulte nossa Política de privacidade